Nova PrEP semestral pode combater totalmente a infecção pelo HIV

O lenacapavir, um inibidor da função do capsídeo do vírus da imunodeficiência humana (HIV) de uso semestral, apresentou 100% de eficácia na prevenção contra o HIV em mulheres com alto risco de infecção, segundo uma análise preliminar do estudo de fase 3 PURPOSE 1.

Os resultados foram tão promissores que o comitê independente de monitoramento de dados que acompanhava a pesquisa recomendou que a empresa Gilead Sciences interrompesse a fase cega do estudo e oferecesse o lenacapavir (sem nenhum cegamento) a todos os participantes.

Os achados foram inesperados e interessantes. “Atuo na área do HIV há muito tempo e não existe nenhum outro estudo de fase 3 sobre a profilaxia pré-exposição (PrEP) que não tenha encontrado nenhum caso de infecção”, disse a Dra. Moupali Das, Ph.D., diretora-executiva de desenvolvimento clínico na farmacêutica Gilead Sciences, nos Estados Unidos.

O estudo PURPOSE 1 visa avaliar a segurança e a eficácia de dois esquemas — PrEP com lenacapavir subcutâneo semestral e Descovy oral (entricitabina 200 mg + tenofovir alafenamida 25 mg) uma vez ao dia — em mulheres e adolescentes de 16 a 25 anos. Os dois medicamentos estão sendo comparados com o padrão atual — Truvada oral (entricitabina 200 mg + fumarato de tenofovir desoproxila 300 mg) uma vez ao dia.

Não foram detectados casos de infecção por HIV entre as mais de 2 mil mulheres que receberam o lenacapavir. Por outro lado, a incidência de HIV nas participantes tratadas com o Descovy e Truvada foi de 2,02 casos por 100 pessoas-ano e de 1,69 casos por 100 pessoas-ano, respectivamente.

A incidência basal de infecção por HIV, um dos desfechos primários do estudo, foi de 2,41 casos por 100 pessoas-ano com o lenacapavir. Todos os medicamentos se mostraram seguros e bem tolerados, e os dados preliminares completos do estudo serão divulgados em uma conferência futura, segundo a Dra. Moupali.

Nenhum caso novo

A comunidade médica está “bastante entusiasmada” com os resultados vistos até agora, disse a Dra. Monica Gandhi, médica e diretora do UCSF-Gladstone Center for AIDS Research, nos EUA. “Temos que esperar pelos dados completos, mas até o momento o medicamento tem se mostrado 100% eficaz e muito superior a outros tratamentos.”

A Dra. Monica também disse que espera ver mais detalhes sobre os efeitos colaterais e a tolerabilidade do fármaco, além das taxas de suspensão do medicamento no estudo e os motivos pelos quais alguns participantes saíram da pesquisa. Por exemplo, o lenacapavir tende a causar a formação de nódulos subcutâneos, que são os depósitos a partir dos quais o medicamento é liberado ao longo de seis meses. A médica acrescentou que está interessada em saber se algum participante ficou incomodado com essas alterações a ponto de interromper o tratamento.

A epidemia global de HIV continua em atividade, com 1,3 milhão de novos casos em 2022, e as opções orais de PrEP disponíveis atualmente, e até mesmo o cabotegravir injetável de ação prolongada, não conseguiram reduzir as taxas de infecção como se esperava, disse a Dra. Monica. “Estávamos aguardando outra alternativa [para a profilaxia].”

A injeção semestral de lenacapavir é facilmente administrável em comparação com a PrEP oral. Muitas pessoas — especialmente os mais jovens, como os inscritos no estudo PURPOSE 1 — têm dificuldade de se lembrar de tomar os comprimidos diariamente.

Uma opção discreta

Muitos participantes do estudo afirmaram que se sentiam desconfortáveis com o estigma que pode estar associado ao uso da PrEP contra o HIV. Eles não queriam que as pessoas vissem o frasco de comprimidos em suas casas ou o ouvissem chacoalhando em suas bolsas. Nesse contexto, uma injeção administrada apenas duas vezes por ano em um consultório médico parece bastante atraente.

“Essa é uma opção discreta. Os participantes estavam muito empolgados com a privacidade [da intervenção] e com o fato de não terem que tomar comprimidos diariamente”, disse a Dra. Moupali. “A PrEP só funciona se o paciente tomar o medicamento.”

Uma melhor adesão ao esquema de tratamento é provavelmente uma das razões pelas quais o lenacapavir superou a PrEP oral. Além disso, o medicamento tem um mecanismo de ação único, atuando como um inibidor da função do capsídeo viral e afetando vários estágios da infecção pelo HIV, disse a Dra. Moupali. O lenacapavir tem como alvo o capsídeo antes e após a integração do vírus com o núcleo da célula hospedeira, o que pode ser outra razão para a sua potência.

Embora os resultados sejam animadores, ainda existe alguma preocupação com o acesso ao medicamento, especialmente em países de baixa e média renda, nos quais o impacto do HIV é mais elevado. “Ninguém tem ideia de como a Gilead planeja tornar o fármaco acessível”, disse a Dra. Monica.

Problemas de acesso

A farmacêutica não faz parte do Medicines Patent Pool (MPP), uma iniciativa que permitiria que outras empresas produzissem formulações genéricas do lenacapavir. Segundo a Dra. Monica, essa seria a via tradicional para fornecer alternativas mais baratas aos países mais pobres. O lançamento “desastroso” do cabotegravir injetável, que ainda não está amplamente disponível em países de baixa renda, é um precedente preocupante, disse ela.

Gilead Sciences confirmou que todos os 5.300 participantes do estudo PURPOSE 1 terão a opção de continuar a receber o lenacapavir até que o medicamento esteja amplamente disponível no seu país. A empresa também se comprometeu a garantir o fornecimento nos países onde a necessidade é maior, até que parceiros de licenciamento voluntário consigam produzir versões do lenacapavir de alta qualidade e baixo custo.

Além disso, em vez de recorrer ao MPP, a Gilead Sciences está negociando um programa de licenciamento voluntário diretamente com outros parceiros para fornecer versões genéricas do medicamento nos países mais pobres.

O lenacapavir já foi aprovado para o tratamento do HIV multirresistente, mas ainda não existe uma aprovação para o uso profilático. Um estudo similar, denominado PURPOSE 2, está em andamento e visa testar o uso do lenacapavir em homens que fazem sexo com homens, homens trans, mulheres trans e indivíduos não binários que fazem sexo com parceiros designados como homens no nascimento. Caso esses resultados, esperados até o final de 2024 ou início de 2025, sejam positivos, a empresa avançará com os trâmites regulatórios para a PrEP com o lenacapavir.

Outros três estudos também estão em andamento. O PURPOSE 3 e o PURPOSE 4 são menores e estão sendo realizados nos EUA, com mulheres e usuários de drogas injetáveis. O PURPOSE 5 está recrutando pessoas com alto risco de infecção pelo HIV na França e no Reino Unido para fornecer dados locais às agências reguladoras europeias.

Bibliografia: https://portugues.medscape.com/verartigo/6511374#vp_2

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